Sempre se atribuiu a característica de aleatoriedade aos contratos de seguro (ou, em termos informais, algo que depende do acaso para ocorrer), na medida em que há imprevisibilidade quanto a ocorrência do sinistro.
Esta característica, entretanto, tem sido relativizada quando se tem em conta os complexos cálculos atuariais e matemáticos que envolvem a análise do risco e do respectivo, prêmio.
Certamente, a análise do risco passível de cobertura, e, consequentemente, do prêmio a ser cobrado, depende estritamente das informações prestadas pelo segurado tanto na fase pré-contratual, quanto durante o curso da relação entre as partes.
Em última instância, são estas informações que permitirão à seguradora avaliar o que será objeto de cobertura e a probabilidade da ocorrência do sinistro, para que, assim, possa delimitar o prêmio correlato.
É pensando nos riscos calculados e, naturalmente, no prêmio cobrado, que, no caso de seguro de crédito, a Apólice delimita algumas variáveis que devem ser observadas pelo segurado como (i) o prazo máximo de concessão de crédito aos compradores; (ii) o limite de crédito à compradores previamente avaliados; (iii) limite máximo de indenização por Apólice; (iv) possibilidade ou não de prorrogação de datas de vencimento; (v) obrigação de cessar vendas à compradores que estejam em mora há mais de um determinado período, dentre outras.
São estas condições previamente estabelecidas que lastreiam o risco assumido pelas seguradoras e, obviamente, a contraprestação a ser paga (prêmio).
O risco coberto, portanto, ainda que seja dotado de certa imprevisibilidade, não deixa de ser objetivo, claro e expresso, de modo que, apenas se deve realizar indenização sobre aquilo que foi efetivamente disposto na Apólice.
Interpretações extensivas ou ampliativas, certamente, resultariam em desequilíbrio entre o prêmio pago e o risco assumido, o que não apenas comprometeria a relação de paridade que deve pautar as Apólices, como ameaçaria a higidez e liquidez dos fundos de prêmios, representando um risco sistêmico para todo o mercado e para a sociedade como um todo. É, exatamente, por isso, que o artigo 757, do Código Civil impõe que “o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.”
Ou seja, havendo situações em que se extrapola os riscos delimitados na Apólice, não há como se cogitar de cobertura.
Felizmente, o Tribunal de Justiça de São Paulo tem sido bastante coerente em suas decisões, ao entender que apenas devem ser cobertos riscos expressamente previstos na Apólice de Seguro de Crédito, não se admitindo cobertura de situações diversas daquelas objetivamente cobertas.
Neste sentido, já se entendeu que não é passível de cobertura (i) créditos em que há discussão sobre a exigibilidade do débito, já que o devedor alega que efetuou o pagamento (ainda que, em conta diversa daquela constante da fatura)¹; (ii) casos em que o segurado mantem vendas à empresa em mora, quando a Apólice dispõe sobre a obrigação de cessação de vendas².
Em um mercado ainda sub-utilizado, como o seguro de crédito, precedentes judiciais que versem sobre esta modalidade de seguro são relevantes, pois imprimem mais segurança jurídica na relações entre seguradora e segurado.
¹TJSP 1061543-46.2021.8.26.0100;
² TJSP 1074867-06.2021.8.26.0100;