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STJ DECIDE QUE O PRÊMIO DE SEGURO NÃO SE SUBMETE À RECUPERAÇÃO JUDICIAL E PODE SER COBRADO EM AÇÃO INDIVIDUAL

Em recentíssima decisão (Maio/2023) , o STJ alterou entendimento anterior (proferido em 2020¹) para entender que “os valores dos prêmios securitários não repassados à empresa seguradora não constituem créditos sujeitos à recuperação judicial (Lei 11.101/2005, art. 49), devendo ser restituídos à seguradora”², em ação individual e independente da recuperação judicial.

No caso específico, a seguradora havia celebrado contrato de representação de seguro, com determinada sociedade de comercialização de eletrodomésticos, por meio do qual, a dita sociedade, ao vender seus eletrodomésticos, seria a responsável por recolher prêmios de seguro, em razão de seguro de garantia estendida, devendo repassá-los à seguradora.

Ao entrar em recuperação judicial, a sociedade e representante de seguros passou a reter os prêmios, sem, portanto, repassá-los à Seguradora, alegando, para tanto, que os valores representariam crédito anterior ao pedido de recuperação judicial e que, portanto, se submeteriam à recuperação judicial, de modo que a Seguradora deveria habilitar-se como credora naqueles autos e, pior, submeter-se às novas condições de pagamento previstas no Plano (com deságio, carência, parcelamento, etc.).

O Tribunal de Justiça de São Paulo acolheu os argumentos da empresa em recuperação e entendeu que ““a retenção da quantia que pertencia à seguradora se equipara a qualquer outro tipo de descumprimento de obrigação”, e que “o crédito constituído em momento anterior ao pedido de recuperação deve ser habilitado pela credora”.

A Seguradora recorreu ao STJ e argumentou que não teria propriamente um crédito em face da empresa em recuperação, mas valores de sua titularidade, recebidos em seu nome, que lhe deveriam ter sido repassados, sob pena de prejudicar a matemática atuarial destinada ao adimplemento de suas obrigações assumidas perante os segurados.

Felizmente, o STJ acolheu os pedidos da Seguradora entendendo que (a) a intermediação da empresa em recuperação, para simples recebimento de prêmios que devem ser repassados à Seguradora, não a torna proprietária dos valores relativos ao prêmio, assim como não é responsável pelo risco do sinistro ocorrer; (b) deve-se aplicar por analogia, a jurisprudência relativa aos produtos agropecuários depositados em armazém, aos créditos consignados e ao dinheiro em poder do falido, recebido em nome de outrem, que entendem que, o simples fato de o dinheiro estar em poder da empresa em recuperação, não a torna proprietária dos valores.

A decisão é relevante, pois permite que, em casos em que representantes de seguro ingressem com recuperação judicial, eventuais prêmios recolhidos e não transferidos à seguradoras sejam perseguidos por meio de ação individual, sem a necessidade de submissão de tais créditos à reestruturação (com aplicação de deságio, carência, parcelamento etc). Além disso, o precedente pode ser usado para evitar situações, em que as seguradoras sejam compelidas a arcar com indenização, em razão de sinistro ocorrido, sem que tenham percebido o correspondente prêmio, o que, obviamente, seria uma verdadeira ameaça ao equilíbrio que deve permear a relação atuarial entre prêmio e sinistro, algo que, em última instância, ameaçaria todo o mercado de seguro.

¹Recurso Especial nº.1.559.595

²Recurso Especial nº. 2.029.240