As seguradoras de crédito são, no mais das vezes, essenciais para assegurar maior disponibilidade e apetite dos segurados em manter o fornecimento à determinados compradores. Isto porque, são as seguradoras de crédito que garantem que, num cenário de inadimplência, parte do crédito seja recuperado pelo fornecedor (normalmente, os contratos de seguro de crédito preveem cobertura de um percentual da dívida).
Compreendida a participação essencial da seguradora de crédito nas relações de fornecimento, fica clara a sua também importante participação num cenário de distressed (quando determinado comprador, por exemplo, ingressa em recuperação judicial).
Evidentemente que, num cenário de recuperação judicial, a primeira reação do mercado e, obviamente, dos fornecedores é imediatamente cessar novas vendas, já que não há garantia de soerguimento e recuperação da atividade de seu comprador, agora em recuperação judicial, sendo natural a insegurança do fornecedor de que recuperará a dívida inadimplida, não sendo natural que pretenda manter novas vendas, com, obviamente, aumento da exposição financeira.
Esta insegurança, entretanto, pode ser, naturalmente, reduzida quando, na relação comercial, há cobertura por seguro de crédito e, as três partes (empresa em recuperação judicial, fornecedor segurado e seguradora) estabelecem, no Plano de Recuperação Judicial condições privilegiadas de recuperação do crédito para ambos os credores (seguradora e fornecedor segurado), em troca, não apenas da manutenção do fornecimento pelo fornecedor segurado, mas também, da manutenção da cobertura do seguro de crédito.
Do lado da seguradora, apesar de as Apólices, normalmente, preverem a exclusão de cobertura para empresas em recuperação, se a recuperação do crédito for célere e integral, é possível que, excepcionalmente, se mantenha a cobertura sobre novas vendas, o que, obviamente, resulta num interesse maior do fornecedor segurado em manter a relação comercial com a empresa em recuperação judicial, contribuindo, assim, para o seu soerguimento.
Esta, portanto, é uma situação positiva para todas as partes envolvidas, pois (i) a seguradora garante a recuperação da indenização paga, de forma mais rápida; (ii) o fornecedor segurado passa a ter cobertura de seguro para as novas vendas, reduzindo seu risco de não recuperação do crédito novo e; (iii) as empresa em recuperação judicial, com a continuidade do fornecimento, aumentam as chances de preservação de sua atividade.
Do ponto de vista jurídico, apesar de a jurisprudência já ser, há tempos, pacífica sobre o tema, a reforma à Lei 11.101/05 estabeleceu objetivamente a possibilidade de o Plano de Recuperação Judicial prever “tratamento diferenciado aos créditos sujeitos à recuperação judicial pertencentes a fornecedores de bens ou serviços que continuarem a provê-los normalmente após o pedido de recuperação judicial, desde que tais bens ou serviços sejam necessários para a manutenção das atividades e que o tratamento diferenciado seja adequado e razoável no que concerne à relação comercial futura”.
Além disso, há um outro argumento jurídico que ratifica a possibilidade de as seguradoras serem consideradas credoras colaboradoras: ao efetuarem o pagamento da indenização aos fornecedores, se sub-rogam nos seus direitos, e, por expresso dispositivo do Código Civil, a sub-rogação transfere ao credor as mesmas condições, privilégios e garantias do crédito original.
Se o segurado é fornecedor colaborador, por força da sub-rogação, as seguradoras de crédito também serão, o que lhes autorizará receber seu crédito sujeito à recuperação judicial nas mesmas condições diferenciadas de pagamento do fornecedor segurado.
Portanto, nada impede que as seguradoras de crédito sejam consideradas credoras colaboradoras e, portanto, possam ser agraciadas com condições diferenciadas de pagamento. Espera-se que, com o crescimento do seguro de crédito (impulsionado por recentes recuperações judiciais, como das Americanas), esta situação seja cada vez mais corriqueira.